domingo, 29 de maio de 2011

MIDIOLOGIAS I


É pertinente iniciar esta abordagem a partir do pensamento de Marshall McLuhan (acima) acerca do que ele denominou de “artefatos humanos”, das ferramentas primitivas à mídia eletrônica, considerando serem as extensões dos indivíduos ou como Hans Hass aponta, traduz-se no resultado da capacidade humana de “criar órgãos adicionais”. Este órgãos ou artefatos podem ser “língua, leis, ideias, hipóteses, ferramentas, vestuário, computadores”, permitindo vantagens como não terem necessidade de nutrição, de poderem ser guardadas ou descartadas e apresentarem caracteristicas intercambiáveis. Aí vale citar o exemplo apontado por Hass no texto de McLuhan de que as extensões permitem o desempenhar de vários papéis, funções, de “forma que, quando ele (o indivíduo) empunha uma lança, é caçador, e quando manobra um remo, é navegante” (2005, p.335).
Mas, a preocupação de McLuhan ante estas extensões é com seus efeitos, que por trazer consigo todo significado das simbologia humana, tem um caráter destrutivo, visto que o homem não estaria devidamente equipado para enfrentar suas consequências. Tal preocupação o levou à abordagem e visões acerca do funcionamento, ações dos artefatos sobre a sociedade, configurando as “Leis da Mídia”, a serem incluídas em livro. Basicamente, McLuhan estabeleceu questões que acreditava formatar uma espécie de conceituação metodológica capaz de compreender os
efeitos. São quatro perguntas: o que a tecnologia amplifica, melhora ou aumenta?; o que ela torna obsoleto?; o que ela resgata ou recupera de um passado distante? (algo que foi rejeitado); o que ela transforma ou inverte subitamente quando levada a seus limites?.
Diante de vários exemplos apontados no texto “O homem e os meios de comunicação’, de 1979, McLuhan compatibiliza a mídia eletrônica em seu método que abarca as quatro questões de “melhoria, obsolescência, recuperação e reversão”. A mídia eletrônica tanto amplifica o raio de atuação da informação, quanto o visual (não sob o ponto de vista estético, mas sob o aspecto presencial), possibilitando, além da maior difusão informacional, o surgimento do “homem eletrônico”, sem corpo. McLuhan alerta para as consequências deste fenômeno: “A implicação de uma existência desencarnada, incorpórea, no mundo da informação é algo para o qual nosso sistema de educação não nos preparou” (p.341).
Ao comparar realidades distintas vividas pela sociedade, a primitiva e a civilizada, McLuhan descreve uma civilização construída com base no alfabeto, proporcionando uma leitura diferente do mundo, uma “
apreensão não-acústica” das sociedades primitivas. O autor evita estabelecer juízo de valor sobre estas sociedades, apenas apontando que o “homem visual, com sua propensão racional e agressiva, foi inventado pelo alfabeto visual” (p.350).

Uma sociedade formada e condicionada pelo alfabeto como elemento de interpretação e significação do mundo, remete ao texto de Vílem Flusser (foto ao lado), “O Mundo
Codificado”. O alfabeto é um código e os códigos, em geral, resultam do impacto da revolução da comunicação na sociedade. Ou seja, os indivíduos vivem num mundo sígnico, de elementos bidimensionais, repleto de cores no atual entorno, com proposta de comunicar algo, de transmitir algo. Flusser considera que há, atualm
ente, um aumento da importância destes códigos bidimensionais frente aos unidimensionais, a exemplo do alfabeto.
Seria como se a humanidade estivesse retornando à origem do que já foi percorrido, visto que antes da invenção da escrita, ela se comunicava através de imagens. Flusser mostra que, nem com o advento da escrita, as imagens perderam sua função de significação, embora a escrita tenha conseguido se impor com o passar do tempo. A comunicação é, considerando estes pontos, uma substituição, em que os “homens têm de se entender mutuamente por meio dos códigos” (2007, p.130).
Esta relação sígnica do homem com o mundo, compreensível segundo códigos bidimensionais ou unidimensionais, possibilita fazer um tensionamento com o uso dos infográficos na transmissão de informação, por seu caráter imagético, repleto de códigos convencionados que são expostos aos leitores que seguem um percurso linear para ser apreendido (assim como imagens primitivas), ou seja, a diacronização da sincronicidade. Ela possibilita que o infográfico se estabeleça como narrativa, um instrumento capaz de sistematizar e representar um dado evento.

Mas, ao confrotar o pensamento das “Capilaridades da Comunicação” de Baitello Jr (foto) com a ampliação dos códigos bidimensionais de Flusser, percebe-se a definição de um novo conceito, o neoanalfabetismo civilizado”, que para Baitello, “declina evidentemente a escrita alfabética elaborada, mas não a escrita como um todo, que se contamina e transforma regressivamente em escrita neopictogramática ou em alfabetos neoideogramáticos de fácil assimilação, mais amigáveis ao tempo veloz, menos exigentes em sua aprendizagem, mais simples em sua imediatez e sobretudo, aptos a gerar leitores com crescente simplicidade”. (2010, p.110). O autor critica este processo e cita que o jornalismo utiliza de “estratégias de emburrecimento” (termo criado por Wertheimer e Zima), ao enfatizar a utilização de elementos como ilustrações, gráficos, manchetes, textos curtos, frases curtas. Ou seja, a infografia, um instrumento de linguagem bidimensional para uma civilização cada vez mais visual, dependentes de códigos para apreensão do mundo, se configura também como uma peça estratégica de enburrecimento e do neoanalfabetismo civilizado de Baitello.


REFERÊNCIAS
McLUHAN, Marshall. O homem e os meios de comunicação (1979). In: ____. McLuhan por McLuhan: entrevistas e conferências inéditas do profeta da globalização. Rio de Janeiro: Ediouro, 2005, p. 326-351.
FLUSSER, Vilém. O mundo codificado. In: ____. O mundo codificado. São Paulo: Cosac Naify, 2007, p. 126-137.
BAITELLO JR., Norval. As capilaridades da comunicação. In: ____. A serpente, a maçã e o holograma: esboços para uma Teoria da Mídia. São Paulo: Paulus, 2010, p. 103-120.

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