Emissão e recepção. Parece que os eixos tradicionais apontados pela Teoria da Comunicação são capazes de agregar uma gama de possibilidades e de atuação da mídia junto ao público. O pensamento do professor José Luiz Braga (foto abaixo), no livro “A Sociedade Enfrenta a Sua Mídia” é de que estes dois pontos não contemplam aspectos diretos de interação da audiência. Interação essa capaz de promover modificações no produto e nos meios de comunicação. Baseando tão somente no título de sua obra, percebe-se que esta sociedade detém dispositivos que avaliam e criticam a mídia, e também instrumentos eficazes que interagem sobre a circulação do conteúdo simbólico.
O dualismo emissão e recepção, a partir dos estudos da comunicação, historicamente observou a mídia como centro, capaz de promover modificações na sociedade. Esta, por sua vez, não manifestava-se ante à sua produção, assimilando todo o significado, consistindo num processo de dominação-dominado que lembra a Teoria da Agulha Hipodérmica ou mesmo a essência da Indústria Cultural, baseada numa manipulação inexorável das massas.
No âmbito da cultura, percebe-se que os nichos sociais e suas manifestações peculiares, tem recepcionado o conteúdo da mídia de diferentes modos. É fundamentação mais evidente da Teoria das Mediações Culturais, quando o deslocamento dos estudos deixam os meios e seguem para as mediações, observando seu aspecto de formação sócio-antropológica. Braga propõe um modelo que reforça a importância da mediação, que ele denominou de “sistema de circulação interacional” ou como Paulo Vaz menciona no prefácio, a terceira via que seria o “sistema de resposta”. Ou seja, a capacidade de audiência criticar, avaliar, julgar e resistir aos produtos midiáticos.
Há uma relação impressionante nos livros abordados neste blog, quanto aos autores que observam a recepção sob um viés pouco, senão nunca antes analisado. Kellner estimula o que ele adota como Pedagogia Crítica da Mídia, um instrumento para dotar a sociedade de capacidade para enfrentar a mídia e filtrar todo o seu conteúdo simbólico. Sobretudo quando Kellner vê a mídia como meio de dominação, que busca impor a ideologia das camadas mais poderosas ao injetar na sociedade uma cultura toda baseada nas produções midiáticas. Seja do ponto de vista político, ideológico ou de comportamento, a cultura da mídia quer formatar
o pensamento de uma sociedade, embora esta mesma mídia seja capaz de oferecer ferramentas para que haja resistência da audiencia a ela.
Tudo isso para mostrar o que está além da campo da emissão-recepção e que Braga propõe-se a apresentar. O artigo de Mayra Rodrigues Gomes classifica esta terceira vertente desta relação com a mídia como “Um conceito para sanar a invisibilidade dos processos sociais sobre as mídias”, um título que mostra-se apropriado para exemplificar como a audiência era percebida até então pelos estudos comunicacionais, como invisíveis ante um processo complexo de mediação. Gomes mostra que este novo conceito oferece um papel ativo à recepção de redimensionar, redirecionar e ressignificar os produtos da emissão.
Este terceiro sistema manifesta-se uma correlação com os demais sistemas. O “sistema de circulação interacional” é apresentado por Braga como ciclo contínuo de uma mediação dinâmica que parte da mídia e que é retomada a ela, que manifesta-se com novas modificações no conteúdo e produtos subsequentemente apresentados. Então, “o sistema de interações sociais sobre a mídia se exerce como parte integrante dos sistemas de produção e recepção. Enquanto momento posterior à recepção, remete-nos ao ponto em que as propostas da mídia se reconfiguram, retomando os anteriores subsistemas, de forma a também abarcá-los nessa reconfiguração” (GOMES, p. 2).
Este ciclo de relações sociais com a mídia, em que a emissão produz, a recepção consome e avalia, ao mesmo tempo, em que retroalimenta a mídia é a base principal dos estudos de Braga. Este sistema processual possibilita, além do fluxo tradicionalmente observado nos estudos da mídia, mas auxilia na compreensão da produção midiática em constante mudança, devido às intervenções críticas da sociedade. O foco do autor é exatamente este: a crítica social da mídia, a aprendizagem ofertada a partir destas intervenções, o controle social e a ação social com base no sistema de resposta.
Braga analisa trabalhos que coadnuam com o sistema de interação social, que constituem uma reação à produção da mídia e não podem ser consideradas apenas como uma manifestação apontada como extramidiática. Mesmo as produções acadêmicas inserem-se na lógica do sistema de resposta de Braga, bem como as discussões de indivíduos em bares, ou as cartas encaminhadas pelos leitores aos ombudsman dos jornais. São objetos que comprovam o dinamismo no processo de circulação de significados. Braga limita-se à selecionar críticas acadêmicas e especializadas.
Os objetos de análise dos estudos de Braga são a coluna de Bernardo Ajzenberg (ombudsman da Folha de S. Paulo), a coluna Conselho do Leitor, da Zero Hora, e o site Observatório da Imprensa. Estas escolhas enquadram-se na perspectiva da crítica especializada. Acerca de obras que abordam a mídia especialmente, sob diferentes viéses, estão A arte de fazer um jornal diário, de Ricardo Noblat, O jornalismo nos anos 90, de Luís Nassif, e A televisão levada a sério, de Arlindo Machado.
Estes objetos são apenas exemplos de um conglomerado muito mais amplo de vozes e de instrumentos de crítica da mídia. Até mesmo as redes sociais na internet servem de parâmetro instantâneo para os veículos de comunicação se autoavaliarem e considerar a reação da audiência diante de sua postura. O conceito proposto por Braga é, de fato, extenso e importante, o que em seus exemplos já deixam bem evidentes. É o que Gomes define: “Toda atividade reflexiva, ou mais particularmente o exercício filosófico, consiste na criação de conceitos com os quais possamos enfrentar as dificuldades teóricas com que nos confrontamos. Descortinando perspectivas de conhecimento, panoramas de hipóteses e espaços de experimentação, é esse o trabalho que realiza José Luiz Braga”. (p. 4)
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