terça-feira, 2 de novembro de 2010

O TECNODETERMINISMO PREGNANTE

Na leitura do livro de Miège, “A Sociedade tecida pela comunicação”, percebe-se que o autor inicia fazendo uma abordagem técnico-social das Tics. Expõe que as técnicas não surgiram para a mídia, mas que que fazem parte de uma gama social que compreende todos os âmbitos. Também mostra que os estudos da comunicação dedicaram reduzida atenção às técnicas de comunicação-informação, enfatizando atualmente questões sócio-simbólicas promovidas pelos meios. Miège cita, como exemplo, as pesquisas relacionadas à televisão, que inicialmente caminhou-se pela técnica e suas características afins, perdurando por vários anos.
O tecnodeterminismo baseia-se na difusão das técnicas em todos os campos sociais. Miège mostra que o técnico e social são inseparáveis, o que leva a observação de José Luiz Braga acerca das demandas sociais que impulsionam o progresso tecnológico. Miège suscita uma reflexão: “Antes de tentarmos situar o técnico, é interessante paramos para refletir sobre a onipresença dos discursos técnicos” (p. 26)

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

CONEXÃO DAS TICS E OS SETE PROCESSOS DE MIÈGE

Fazer uma conexão entre desenvolvimento técnico e práticas sociais é a base dos estudos de Miège. Esta relação está atrelada diretamente com o aparecimento das Tics, as tecnologias de informação e comunicação. Tal relacionamento era pouco analisado pelos estudos da comunicação, que limitava-se a compreender uma transformação social a partir da midiatização, não a partir de seus instrumentos tecnológicos enraizados nesta sociedade. Por isso, Miège esclarece que é preciso medidas profiláticas na abordagem de novas ferramentas de Tic, visto que é necessário observar sua acomodação social e de que forma se processará o enraizamento.
Está claro, como Miège aponta que Tic é tudo aquilo que coloca o indivíduo em comunicação, notadamente as ferramentas e os desdobramentos em torno delas, como o caso da telefonia e, subsequentemente, a internet; a internet e, em seguida, os dispositivos móveis de conexão, como os smartphones e os tablets. A definição da Tic sinaliza para a observação dos processos de mediação e enraizamento social, base também das análises do autor.
Uma forma de mediação é a ligação entre a sociedade e as novas tecnologias. Braga mostra que as demandas sociais é que proporcionam o avanço tecnológico e não o contrário, como se a tecnologia regesse as práticas da sociedade. Este diálogo coadnua com o pensamento de Miège: a sociedade determina o desenvolvimento técnico e este desenvolvimento é constantemente melhorado também por uma ação social. Isto é o que caracteriza a mediação e o enraizamento social.
Este contínuo desenvolvimento da sociedade e das tecnologias de informação leva Miège a apontar sete processos de enraizamento, seegundo aponta Gambaro (2009, p.6) no artigo “O uso das novas TICs pelas emissoras de rádio: uma análise dos casos paulistanos e o referencial de Bernard Miège”:

1) A informacionalização, ou seja, o aumento na oferta de informações, tanto daquelas editadas por profissionais no âmbito das empresas de comunicação, como aquelas produzidas por leigos ou de caráter técnico, que outrora seria principalmente de circulação restrita. A esse processo podemos ligar, por exemplo, o uso de ferramentas como blogs e fóruns.

2) A mediatização da comunicação, que responde pela maior presença de tecnologia nas relações de comunicação (como os e-mails, os jornais na internet, o rádio via web, etc). No entanto, isso não significa que modos anteriores de comunicação, foram ou estão em vias de serem substituídos: na verdade, as tecnologias se somam àquelas já existentes, com alguma adaptação da audiência. O mais relevante é que o processo de mediatização implica diretamente em uma aquisição de competências comunicacionais pelos usuários, e tais competências são conquistadas com os usos, cada vez mais individualizados.

3) Ampliação da esfera midiática; esse processo considera a concorrência que os meios de comunicação de massa enfrentam com os serviços originados a partir da novas TICs, o que resulta diretamente numa pluralidade de dispositivos pelos quais os meios de comunicação distribuem seus conteúdos. Existem nesse contexto dois fatos importantes: os portais de internet ganham maior importância e complexidade, e de certa forma os consumidores esperam que os novos meios se distingam dos anteriores, indo além da comunicação quase unidirecional para práticas mediáticas menos dirigidas e mais interativas. É importante notar que não ocorre substituição dos meios de comunicação de massa pelos serviços de acesso individual a informação.

4) Mercantilização das atividades comunicacionais, ou seja, abre-se a possibilidade de um mercado que pode cobrar do usuário final por práticas de comunicação que, dada em outra esfera distante de certas modalidades tecnológicas seriam gratuitas.

5) A generalização das relações públicas surge com a aproximação dos recurso tecnológicos nos diferentes estratos profissionais, de forma que os departamentos de relações públicas das empresas não ficaram de fora, sendo alçados aos status de produtores de conhecimento (e informação) com credibilidade reconhecida.

6) A diferenciação das práticas sociais; ao definir este processo, Miège indica que as práticas originadas com os usos sociais das novas TICs não significam o abandono de práticas anteriores, possíveis dentro de outras tecnologias. As práticas sociais botam em movimento todo um sistema de identificação sócio-simbólico que torna possível diferenciar social e culturalmente, por exemplo, a audição do rádio no carro, indo ao trabalho, e de um programa acessado via podcast. Outro ponto importante a ser considerado é que as tecnologias não vão reordenar as coisas: continua havendo diferenças nos acessos às tecnologias como há diferenças nos usos, pois existe uma estratificação no acesso que não é tão facilmente rompida. Essa estratificação não corresponde somente aos jogos entre indivíduos economicamente distintos, como também às diferentes gerações de pessoas e os usos dados às tecnologias: se os chats e sites de perfis podem servir como desvios sociais para os mais jovens, as pessoas de mais idade tendem a fazer deles um uso mais próximo das práticas cotidianas.

7) A circulação dos fluxos e a transnacionalização das atividades infocomunicacionais; o que indica uma interdependência entre a globalização e as TICs.

PENSAMENTO DE MIÈGE: COMUNICAÇÃO E TECNOLOGIA


É importante considerar o pensamento do teórico francês Bernard Miège (foto), no que refere-se à relação entre comunicação e tecnologia, sobretudo no século XXI, quando vê a formação de uma sociedade midiatizada, ambientada num universo digital, que como Muniz Sodré esclarece trata-se de uma nova vivência social, proporcionada pelos avanços tecnológicos. As chamadas Tics (Tecnologias digitais de Informação e Comunicação) consolidam e reforçam este aspecto social, sob aspecto de produção, consumo e interrelacionamento entre os indivíduos. Com o incremento das Tics, a própria designação da sociedade da informação ficou mais ampla, abarcando características da modernidade. E para comprrender a visão de Miège sobre esta nova sociedade no campo da comunicação, é preciso considerar: a informacionalização; a promoção das tecnologias e das redes como fator dominante ao conteúdo; a modificação e a expansão dos sistemas midiáticos; e o controle transnacional do fluxo de informação e comunicação.
Estes pontos foram citados na entrevista que Miège concedeu a revista Matrizes, da Usp. O autor mostra que a comunicação moderna não engloba apenas a comunicação pessoal, mas observa o que ele conceituou como “comunicação/informação”, a partir da observação de uma sociedade midiatizada iniciada em meados do século passado. O conceito de comunicação/informação está associada a uma articulação entre os dois, que supera a visão ideológica ou de manipulação da comunicação, mas vê também que a informação é meio de interação entre os atores sociais. As Tics reforçam esta relação, impregnando-se na sociedade e no avanço ao longo do tempo. É o que Miége trata de "dupla mediação", em que a mediação é ao mesmo tempo técnica e, ao mesmo tempo, social. (p. 46 do livro A Sociedade tecida pela comunicação).
A princípio tenho percebido uma relação de visão também técnica da comunicação que me remete à Shannon e Weaver, na primeira metade do século XX e a Teoria da Informação, que observou uma teia comunicacional iniciada no emissor até o receptor, observando a produção sob um canal e distorções como efeitos de ruído. Nota-se uma relação com as novas Tics, visto que como a Teoria da Informação destaca relação com os campos sociais a partir das técnicas físicas de transmissão de dados, vê-se atualmente algo bem mais maturado, onde as técnicas estão inseridas como extensão desta sociedade midiatizada.
Miège deixa isso bem evidente ao fazer uma comparação entre a atual comunicação midiatizada e a mediação cultural proporcionada pela mídia. Esclarece que o “fenômeno da mediação existe nas sociedades há muito tempo nos âmbitos cultural, social, político e jurídico” (p.3), e que, portanto, a comunicação/informação refere-se a midiatização.

“Miège propõe o termo «comunicação midiatizada» para introduzir o papel das TICs nos processos de comunicação, não como um elemento redutor de oposição entre as mídias de massa (consideradas bastante diretivas em seu discurso e unidirecionais) e as mídias digitais (onde as TICs possibilitam a emergência da self media). A comunicação midiatizada é muito mais ampla e complexa, configurando novos sistemas de comunicação nos quais os principais atores são não apenas os grandes conglomerados comunicacionais, os construtores materiais e o Estado, mas também as diferentes categorias de usuários considerados como atores estratégicos desse novo processo”

A expansão técnica, de equipamentos neste processo de midiatização, leva a novas práticas sociais. A produção de conteúdo deixa de ser uma atribuição tão somente dos grandes conglomerados de mídia, por serem detentores da tecnologia antes inacessível ao público em geral. As Tics possibilitaram que mais indivíduos pudessem produzir conteúdo e de serem vistos. Importante citar também que as técnicas que tornaram possíveis a produção de conteúdo também oferecem uma gama de possibilitade de aquisição de informação. E nunca houve tanto acesso à informação na ambiência digital de uma sociedade midiatizada, que supera a simples contemplação da realidade mostrada pelos meios de comunicação e passa a inserir-se na representação com participação direta, como esclarece Sodré.
Miège faz um comparativo da rede digital na esfera pública e privada. A mesma rede que serve a todos, na sociedade midiatizada, é instrumento de lazer, de trabalho e de espaço público. “É isso que seduz nas TICs. É que faz com que pessoas sem formação técnica, como as crianças, a dominem. Somos autodidatas no uso das ferramentas da comunicação”, diz o autor. As Tics alteraram também a visão unidirecional da mídia do passado. TVs, rádios e imprensa se modificam para atender a uma sociedade conectada e onde estas conexões tendem a associar à mobilidade.
Esta sociedade atreladas à tecnologia da informação e da comunicação caracteriza-se também por um processo chamado pelo autor de “enraizamento”, diferente dos conceitos de “inserção social” ou “inclusão social”, que torna-se mais complexo e além do uso. Sua teoria fundamenta-se em sete processos, a saber: a informacionalização, a mediatizacao da comunicação, a ampliação do campo midiático, a mercantilização das atividades comunicacionais, a generalização das relações públicas, a diferenciação das práticas e a circulação em fluxos e transnacionalização das atividades.