quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O PRINCÍPIO DA HEGEMONIA


A visão aplicada por Martin-Barbero em seus estudos na Teoria das Mediações Culturais também caminha pela interdisciplinaridade e não se distancia, apesar do posicionamento bem menos elitista da Escola de Frankfurt, sobre a Indústria Cultural. A Indústria Cultural baseia-se na ideia inexorável de dominação das massas, cujo discurso é assinalado por um receptor passivo, num processo de manipulação das consciências. Barbero apoia-se no conceito de hegemonia de Antonio Gramsci (foto) – que compreende a relação comunicacional proposta pelos Estudos Culturais –, mediante a ideia que tanto é possível admitir a reprodução do sistema de dominação, quanto é possível haver resistência a este sistema.
Observando o texto do professor José Guibson Delgado Dantas, sobre a Teoria das Mediações, o conceito de hegemonia gramsciano fez com que Barbero compreendesse o processo de comunicação além dos meios, movendo o eixo para as mediações, observando suas variedades sociais. Estas variedades estão relacionadas à estrutura (classe social, experiências, conhecimentos, família), instituição (escola, igreja, política, esporte), conjuntura (modo de enxergar a vida, acervo cultural) e tecnologia (televisão, rádio, cinema, etc.).
Ou seja, Barbero foi observar todo conjunto de estratégias organizado pelo dominador, mas o mais impressionante, “os elementos que no dominado trabalham a favor do dominador”. Ou melhor, reside uma relação inconsciente de concordância, uma cumplicidade e como acentuado por Dantas, uma sedução que os permeia. O autor cita Luciano Gruppi (2000, p 3), estudioso de Gramsci, que esclarece que o conceito de hegemonia não atua sobre uma base econômica ou política, mas sobre outras estruturas como modo de pensar e “orientações ideológicas”.
Desta forma, a hegemonia não é estática ou centralizada, porém dinâmica. E para que exista a hegemonia é necessário à classe dominadora representar interesses que a classe dominada também reconhece como seus. Barbero aponta que a hegemonia “é um processo vivido, feito não só de força mas também de sentido pelo poder, de sedução e pela cumplicidade” (p.116). A hegemonia, portanto, não caracteriza-se como um processo em que o dominador intenta esmagar o dominado. Apresenta-se como um elemento que se faz necessário modificar-se constantemente sob o ponto de vista dos dois extremos.
Fica claro, com a fundamentação no pensamento gramsciano sob o papel dos Estudos Culturais, que os meios de comunicação não atuam no receptor como uma espécie de “agulha hipodérmica”, em que este receptor não terá a capacidade de fazer avaliações críticas deste conteúdo simbólico. Ele não é um mero decodificador da mensagem dos meios. Por isso, o eixo é deslocado para a cultura, pois o receptor pode muito bem ignorar conteúdo em que julgue não ser de interesse próprio, de seu grupo, conforme seus valores sociais.
Na cultura popular nem todo discurso hegemônico surtiu efeito em dado povo, diante das resistências e das remodelações da simbologia popular. Isso mostra que o poder hegemônio não atua de forma direta e acintosa, mas precisa submeter-se a uma negociação constante com a classe dominada, a fim de estabelecer interesses comuns e compactuado.
A hegemonia também se deu no processo do popular para o massivo no contexto histórico-social na América Latina. A enculturação patrocinadada pelo Estado-nação, quanto aos usos, línguas, costumes, crenças possibilitou a homoneigização da massa e isso não foi alcançado por meio da força repressiva no século XVII, mas pela produção simbólica. Quer dizer, não há processo hegemônico sem que o povo tenha acesso às linguagens deste discurso, sem a circulação desta produção simbólica.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

OS ESTUDOS CULTURAIS CRÍTICOS

Fazendo um passeio pela internet, deparei com o texto “Uma Abordagem Multiperspectívica para os Estudos de Recepção: o Caso Lasier Martins versus MST”, de Vilso Junior Chierentin Santi e Fábio Souza da Cruz. Não vou entrar no mérito do tema abordado na pesquisa da dupla, mas num ponto que me chamou a atenção a partir de meus estudos acerca dos culturalistas. Um ponto precisa ser considerado: as relações dos meios de comunicação com as matrizes culturais, em especial a movimentos (como no caso específico aqui, o MST). Isso leva a pensar a comunicação além das teorias funcionalistas que concebiam as mídias como “novas ferramentas das democracias modernas, como mecanismos decisivos de regualaç
ão da sociedade” (MATTELART apud SANTAELLA, p.39). Pode considerar tal ponto de vista como princípio ou mesmo como utopia.
As relações precisam ser vistas sob à visão de estudos críticos da comunicação e o caminho estaria nos Estudos Culturais, que no Brasil desembarcaram a partir de três momentos. “O primeiro deles foi a tradução para o português a obra “Cultura e Sociedade” de Raymond Willians em 1970.
O segundo, o lançamento do livro “Dos Meios às Mediações” de Jesús Martín-Barbero e a difusão das idéi
as de outros autores como Néstor García Canclini”. Outros nomes emergem na atualidade para os Estudos Culturais Criticos, como o do americano Douglas Kellner (foto ao lado). O autor defende que não há como dissociar cultura e mídia e que as produções midiáticas são sempre englobadas pela cultura. E propõe o que ele den
omina como “Pedagogia Crítica da Mídia”, consistindo na “resistência à manipulação e a tonificação do repector frente à cultura midiática dominante”.
Portanto, percebe-se uma forte tendência de observar a recepção nas articulações entre meios de comunicação e os movimentos sociais. Barbero desloca o eixo dos meios para as mediações, avaliando questões temporais e a pluralidade de matrizes culturais. (p.280). Encaminhei-me ao texto de Barbero (A Mistura do Povo e Massa no Urbano) que observa tais pluralidades e critica posicionamentos maniqueístas na concepção entre popular e urbano, como o mito de atrelar o urbano ao “antônimo de popular”. Tal conceito é considerado por Barbero como um renitente posicionamento da elite aristocrática.
Diante de um universo de percepção que divide o popular do urbano, caracterizando o primeiro como ingênuo, imaturo e politicamente infantil, e o segundo como ligado a uma cultura maturada, surgem novas reflexões sobre o popular urbano, cujas identificações seriam modificadas ou “homogeinizadas” pela Indústria Cultural: os impactos provocados pelo advento do rádio e do cinema (convertendo o populismo em nacionalismo na América Latina) e, em seguida, pela televisão (com ações mais dinâmicas a partir dos anos 60), com a difusão de bens e produtos, o discurso sobre o que é modernidade e o que é anacrônico, e a linguagem. “O rádio nacionalizou o idioma, mas preservou alguns ritmos, sotaques, tons. A televisão unifica para todo o País uma fala na qual, exceto para efeito de folclorização, a tendência é para a erradicação das entonações regionais” (p.280)
Voltando para os estudos culturais, nota-se o deslocamento do eixo dos meios para as mediações e ao mover aos atores sociais, em suas matrizes culturais, desenvolve-se, então, toda a complexidade dos estudos das mediações. Como citado no texto, “estudar a cultura da mídia também implica em realizar uma investigação que desloque a ênfase dos meios para as mediações, promovendo uma integração entre produção, texto e recepção (CRUZ, 2006, p.69)”.
Partindo para os atores sociais, pode-se admitir que, deixa-se os espaços restritos da mídia para entrar no campo vasto das mediações e a entender todo o processo de recepção ante a diferentes receptores e que tais receptores comportam-se de forma diferente ante a informação veiculada, ante ao discurso, ante à produção simbólica da mídia. Inclusive, grupos expõem reação de resistência a esta produção simbólica, não compactuando com sua essência. Outros aceitam em parte, descartando aquilo que não convém; outros, simplesmente aceitam o discurso em sua totalidade, reproduzindo-o em seguida.
Este processo de recepção se dá em dimensões que merecem ser consideradas e não apenas no manejamento do receptor com a máquina difusora das informações. Ou seja, a influência (ou não) dos meios e das mensagens não se estabelecem tão somente no momento em que a televisão é ligada e desligada. Ela provoca contornos em diversos agentes e instituições sociais, como apontado por Orozco Gomes. É o que o trabalho nomina como avaliar o abarcamento do nível empírico. O estudo de recepção necessitaria de avalar o volume e os diversos cenários sociais deste abarcamento.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

ILUSTRADOS E ROMÂNTICOS

Aproveito para observar um texto acerca da obra “Dos Meios às Mediações”, do professor espanhol e pesquisador no México, Jésus Martin-Barbero, um dos maiores expoentes dos Estudos Culturais na contemporaneidade. E começo fazendo um rápido relato acerca de seu pensamento sobre “Povo e Classe: do anarquismo e marxismo” (p.43). Barbero apresenta distinção acerca de movimento do povo na política (chamado de ilustrados) e do povo na cultura (chamado de românticos), que assemelha-se à visão de dominação, de burguesia de Marx. Tal separação faz surgir categorias como “culto” e “popular”, apresentando o popular como “inculto”. Barbero aponta tal raciocínio como “definição do povo por exclusão, tanto da riqueza como do ofício político e da educação” (p.37).
A diferença, para Barbero, não torna estas duas categorias interdependentes. Para o autor, a relação do popular na cultura baseia-se na relação que este povo adquire na política
“como é elaborada pela Ilustração”. Mas, aponta uma característica própria da cultura popular, não formada por influências de cima para baixo, das classes dominantes, do movimento ilustrado. Mas, que é preciso aceitar a existência de um pluralidade de culturas, que como exemplificado por Herder, reflete-se em modos diversos na configuração da vida social. E que o movimento romântico faz crer na existência de outra cultura, além da cultura hegemônica.
Aliás, Barbero sinaliza para o que ele chama de “ruptura do exclusivismo cultural”, questionando posições tanto de romãnticos quanto de ilustrados. Românticos mediante ao discurso de resgate da cultura popular, negando a circulação cultural ou o “processo histórico de formação do popular e o sentido social das diferenças sociais”. Ilustrados, devido pelo perfil evolucionista, de encarar o popular como o atrasado no desenvolvimento da humanidade (observação européia).
Tem-se então, uma abertura para uma avaliação antropológica acerca das diversidades culturais. Nota-se uma diferença acerca do pensamento cultural entre Barbero e Marx, quando o primeiro vê que o popular consegue se infiltrar no massivo, mantendo suas tradições e sua cultura. O princípio marxista entende que as ideias de uma época são as ideias de uma classe dominante e, “por mais que haja as visões que fujam a essas idéias, elas não podem empreender mudanças concretas na sociedade apenas em âmbito cultural”. Ou seja, Marx faz uma associação direta da cultura com a economia. Barbero vê a cultura em suas relações sociais.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

MEDIAÇÃO

Para Silverstone, a mídia é um processo de mediação, que implica, não apenas no movimento de significados, mas nas transformações destes significados em todos os seus estágios. Esta circulação gerada pela mídia também tem a colaboração dos indivíduos em sua relação da mídia com a experiência (como citado no texto anterior). Quer dizer, a meciação é a circulação de significados. O autor acrescenta que esta circulação é mais que o esquema proposto por Lazarsfeld e Katz, no conceito denominado two step flow - ou o fluxo em dois passos -, em que a informação esbarra nos líderes, que repassam aos indivíduos.
Os significados circulam em toda a produção da mídia e tais significados são consumidos e produzidos pela audiência. Desta produção, surgem as ações, interações, relações com o mundo (mundo este apontado por Silverstone como o “mundo da mídia, o mundo mediado, o mundo da mediação”). Neste mundo complexo, é complexo também entender o poder da mídia, diante da sua presença simbólica na sociedade e a relação desta com a mídia. E pesquisar este tema traduz-se em analisar a mídia estando dentro dela. O pesquisador está inserido dentro desta cultura midiática e sua produção significam, do mesmo modo, produto do processo de mediação. E faz um comparativo: “somos linguistas tentando analisar a sua própria língua” (p.34). Desvencilhar-se disso é o mesmo que o homem sair do alcance de sua sombra, como aponta Steiner.
A mediação trata a significação como o movimento hermenêutico de uma tradução. Uma relação que consiste em quatro pontos: confiança (valor de que quer compreender o que é traduzido), agressão (pela apropriação, pela suposta posse de seu significado), apropriação (levar os significados para casa) e restituição (a forma com o tradutor devolve o significado). Como mostra Luís Borges, “nenhuma tradução pode ser perfeita”. Portanto, nenhuma mediação também é perfeita.
Silverstone afirma que é preciso compreender todo o processo de mediação, como os significados são construídos e quais as suas consequências. E perceber também quando este processo é falível e quando estes significados são deturpados por força tecnológica ou de propósito com fins de atender a interesses do poder, de indivíduos ou instituições.

Relação mídia e experiência

Silverstone aponta que a mídia não é a medida de todas as coisas e que existem nos usuários a capacidade de discernimento na ação midiática, de fazer distinção entre realidade e fantasia e de preservação de distância com a mídia, o que implica em procedimento diferente da influência dos meios.
Por não ser a medida de todas as coisas, a mídia precisa ser investigada em função da experiência, do empírico, que contribui para sua formação. E vice-versa, como a experiência age na formação da mídia. Isto faz lembrar da corrente que ganhou força nos anos 80, a da hipótese dos Usos e Gratificações, modificando o conceito anterior da pura influência da mídia nas pessoas para um comportamento ativo da audiência. Ou seja, uma troca sinérgica que molda a mídia e a experiência.
Se a experiência é formada e a mídia exerce um papel em sua formação, Silvestorne questiona: como procede? A começar, a expressão corporal, que nos dá lugar na vida e oferece condições para a mídia introduza, sob o aspecto da habilidade. Ou seja, “nossa capacidade de de nos envolver com a mídia é precondicionada por nossa capacidade de manejar a máquina” (p.28) Seriam as extensões do homem, uma intimidade visceral, que faz confundir o que é humano e o que é tecnico.
Outro ponto desta formação baseia-se na psicanálise, dos significados, do inconsciente, “dos territórios ocultos da mente”. Como salienta Silverstone, “a experiência, tanto a mediada como a da mídia, surge na interface do corpo e da psique” (p.30), ou melhor, no social e nos discursos. O cotidiano da experiência é retratada nas narrativas mídia, seja no noticiário jornalístico, seja na produções ficcionais como reflexo do dia-a-dia social. O discurso da mídia, com base nas relações do cotidiano, e o discurso social deste cotidiano são interdependentes, entrelaçam-se, e proporcionam forma à experiência. Assim, o entrelaçamento envolve o público e o privado.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A partir de hoje, vou postar meus estudos sistemáticos acerca da mídia e estudos sociais para fins de compartilhar um pouco acerca de minhas leituras. Estabeleço aqui algumas resenhas, faço comparativos com outras obras, que podem servir para quem busca compreender um pouco sobre a necessidade de investigar a relação da mídia com a sociedade e suas significações.


POR QUE ESTUDAR A MÍDIA? Roger Silverstone (edições Loyola, São Paulo, 2002)

No capítulo “Textura Geral da Experiência”, o professor Roger Silverstone inicia apresentando um exemplo de um programa de TV sobre a vida e o trabalho de transexuais e travestis. Um programa sensacionalista busca “incendiar” a audiência com perguntas do tipo: vocês pretendem ter filhos? e m
omentos que caminham pelo preconceito e também pela exploração. Silverstone exemplifica esta situação na TV como um momento “explorador”, mas também “explorável”. E sua força consegue compreender além do local (a abrangência do programa), atingindo também o global.
Silverstone, a o apontar este exemplo, mostra a representação da televisão do cotidiano, do que é “ordinário e contínuo”.
Estas representações televisivas identificam-se com a sociedade diante de suas reações. Estas reações, por sua vez, apresentam-se como identitárias da sociedade. Esta sinergia TV-audiência torna-se cada vez mais intensa, a ponto da audiência não conseguir mais desvencilhar-se dela. “Passamos a depender da mídia, tanto impressa como eletrônica, para fins de entretenimento e informação, de conforto e segurança, para ver algum sentido nas continuidades da experiência”, aponta o autor.
Diante desta relação, Silvestone fez a indagação: “por que estudar a mídia?”. É mais que observar usuários de internet, pessoas que passam horas diante da TV, lendo jornais ou diante dos números absurdos da venda de softwares. Mas, entender o que a mídia faz e o que a sociedade faz com ela. O estudo, citado por Silverstone, caminha pela dimensão social e cultural, e também política e econômica. “Estudá-la como algo que contribui para a nossa variável capacidade de compreender o mundo, de produzir e partilhar seus significados”. Esta relação da mídia e sua importância leva a compreender inicialmente, a razão dela ser fundamental para a vida cotidiana.

A ligação da mídia com a vida cotidiana, leva o autor a fazer um paralelo com Isaiah Berlin. Que é preciso estudar a mídia sob a visão da “textura geral da experiência”, que retrata as experiência do dia-a-dia. Isto porque a sociedade, para Berlin, é ativa porque “perseguem fins, moldam sua vida e a dos outros, sentem, refletem, imaginam, criam, em constante interação e intercomunicação com outros seres humanos”, assegura. E a mídia está diretamente atrelada a este processo social.

São apresentadas outras espécies de metáforas para a compreensão do papel da mídia na sociedade, a saber:

Como condutos: que oferecem rotas mais ou menos imperturbadas da mensagem à mente
Como linguagens: que fornece textos e representações para interpretação.
Como ambientes: que nos abraçam na intensidade de uma cultura midiática, saciando, contendo e desafiando sucessivamente.
Ou mesmo a metáfora de Marshall Mcluhan, que a vê a mídia como extensão do homem, como próteses, “que aumentam o poder, a influência”.

As metáforas para Silverstone servem para explicar, até certo ponto superficialmente, acerca da visão da mídia. Porém, salienta a necessidade de aprofundamento e investigação sobre as formas como a mídia participa da vida cotidiana e social, observando-a como um “processo”. É um processo histórico (viu-se avançar do telefone, cinema, rádio, TV, para a internet) e também político (ou, como o autor cita, “politicamente econômico”, por conta da ação de instituições globais na produção destes significados que invadem os indivíduos).


DIMENSÕES PRODUTIVAS E DISTRIBUTIVAS
Silverstone também levanta debate sobre dimensões “produtivas e distributivas” da mídia contemporânea e a relação de governos de controlar os dados em seu território. Por tal razão, o autor avalia o potencial da mídia e sua influência social e ideológica, abre questões como “quem medeia a mídia?” e “Com quais consequências?”, para, enfim, chegar na via que busca explicação para o estudo da mídia.

Mais que investigar respostas para o conteúdo simbólico gerado pela mídia, é preciso entender a presença cotidana da mídia na sociedade. Uma sociedade intrinsecamente ligada com os instrumentos midiáticos, de uma conexão para outra. Do rádio para a internet, da internet para a televisão, da televisão para o telefone, do telefone para o jornal. Um ciclo cumprido individualmente ou em grupo.

E a mídia opera neste espaço, através destas conexões, no “mundo mundano” como citado por Silverstone. A mídia observa a realidade da vida cotidiana, a filtra, estabelecendo critérios, referências, representações e significações. Ou seja, a mídia baseia-se no cotidiano, no senso comum. Acrescenta que “a mídia nos deu palavras para dizer, as ideias para exprimir, não como força desencarnada operando contra nós, enquanto nos ocupamos com nossos afazeres diários, mas como parte de uma realidade que participamos” (p. 21). Silvestone acrescenta que a mídia depende do senso comum. “Ela o reproduz, recorre a ele, mas também o explora e distorce” (p.21).
Esta capacidade de distorcer é o que conduziu à reflexão de CHARAUDEAU sobre a mídia como um “espelho deformante, ou mais ainda, são vários espelhos deformantes ao mesmo tempo, daqueles que se encontram em parques de diversões e que mesmo deformando, mostram, cada um à sua maneira, um fragmento amplificado, estereotipado do mundo”. Ou seja, as mídias são o espetáculo da democracia e não a própria democracia.

Silverstone faz um paralelo entre a reflexão feita acerca da mídia em suas narrativas como integrante da vida social (novela, programa de rádio, telejornais), mas a experiências do mundo contemporâneo e ao papel midiático nela. Por exemplo, ele cita metáforas espaciais (comentando desde o conceito de pós-modernidade, em que o tempo não é mais o que era), e veículos antes baseados no tempo (como o rádio), e a internet e o videogame alterando este modelo temporal. É o espaço em múltiplas dimensões, como apontado por Manuel Castells (1996).

Fica evidente para o autor que estudar a mídia é compreender a sua contribuição para a textura geral da experiência, o que leva a indagação acerca da realidade da experiência. Há realidade? existe realidade na mídia ou no cotidiano? Tais observações vão de encontro com a teoria pós-modernista de que o mundo “é sedutora e exclusivamente” de imagens e simulacros. Ou seja:

“O mundo é um mundo em que as realidades empíricas são progressivamente negadas, tanto por nós quanto para nós, no senso comum e na teoria. Nessa visão, vivemos nossas vidas em espaços simbólicos e auto-referenciais que nos oferecem nada mais que generalidades do sucedâneo e do hiperreal” (p.26)

A abordagem levou-me ao conceito de abstração de BAUDRILLARD, em “Simulacros e Simulação”, que ao destacar o hiperreal, aponta para a “geração pelos modelos de um real sem origem nem realidade” (p.8)