quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A partir de hoje, vou postar meus estudos sistemáticos acerca da mídia e estudos sociais para fins de compartilhar um pouco acerca de minhas leituras. Estabeleço aqui algumas resenhas, faço comparativos com outras obras, que podem servir para quem busca compreender um pouco sobre a necessidade de investigar a relação da mídia com a sociedade e suas significações.


POR QUE ESTUDAR A MÍDIA? Roger Silverstone (edições Loyola, São Paulo, 2002)

No capítulo “Textura Geral da Experiência”, o professor Roger Silverstone inicia apresentando um exemplo de um programa de TV sobre a vida e o trabalho de transexuais e travestis. Um programa sensacionalista busca “incendiar” a audiência com perguntas do tipo: vocês pretendem ter filhos? e m
omentos que caminham pelo preconceito e também pela exploração. Silverstone exemplifica esta situação na TV como um momento “explorador”, mas também “explorável”. E sua força consegue compreender além do local (a abrangência do programa), atingindo também o global.
Silverstone, a o apontar este exemplo, mostra a representação da televisão do cotidiano, do que é “ordinário e contínuo”.
Estas representações televisivas identificam-se com a sociedade diante de suas reações. Estas reações, por sua vez, apresentam-se como identitárias da sociedade. Esta sinergia TV-audiência torna-se cada vez mais intensa, a ponto da audiência não conseguir mais desvencilhar-se dela. “Passamos a depender da mídia, tanto impressa como eletrônica, para fins de entretenimento e informação, de conforto e segurança, para ver algum sentido nas continuidades da experiência”, aponta o autor.
Diante desta relação, Silvestone fez a indagação: “por que estudar a mídia?”. É mais que observar usuários de internet, pessoas que passam horas diante da TV, lendo jornais ou diante dos números absurdos da venda de softwares. Mas, entender o que a mídia faz e o que a sociedade faz com ela. O estudo, citado por Silverstone, caminha pela dimensão social e cultural, e também política e econômica. “Estudá-la como algo que contribui para a nossa variável capacidade de compreender o mundo, de produzir e partilhar seus significados”. Esta relação da mídia e sua importância leva a compreender inicialmente, a razão dela ser fundamental para a vida cotidiana.

A ligação da mídia com a vida cotidiana, leva o autor a fazer um paralelo com Isaiah Berlin. Que é preciso estudar a mídia sob a visão da “textura geral da experiência”, que retrata as experiência do dia-a-dia. Isto porque a sociedade, para Berlin, é ativa porque “perseguem fins, moldam sua vida e a dos outros, sentem, refletem, imaginam, criam, em constante interação e intercomunicação com outros seres humanos”, assegura. E a mídia está diretamente atrelada a este processo social.

São apresentadas outras espécies de metáforas para a compreensão do papel da mídia na sociedade, a saber:

Como condutos: que oferecem rotas mais ou menos imperturbadas da mensagem à mente
Como linguagens: que fornece textos e representações para interpretação.
Como ambientes: que nos abraçam na intensidade de uma cultura midiática, saciando, contendo e desafiando sucessivamente.
Ou mesmo a metáfora de Marshall Mcluhan, que a vê a mídia como extensão do homem, como próteses, “que aumentam o poder, a influência”.

As metáforas para Silverstone servem para explicar, até certo ponto superficialmente, acerca da visão da mídia. Porém, salienta a necessidade de aprofundamento e investigação sobre as formas como a mídia participa da vida cotidiana e social, observando-a como um “processo”. É um processo histórico (viu-se avançar do telefone, cinema, rádio, TV, para a internet) e também político (ou, como o autor cita, “politicamente econômico”, por conta da ação de instituições globais na produção destes significados que invadem os indivíduos).


DIMENSÕES PRODUTIVAS E DISTRIBUTIVAS
Silverstone também levanta debate sobre dimensões “produtivas e distributivas” da mídia contemporânea e a relação de governos de controlar os dados em seu território. Por tal razão, o autor avalia o potencial da mídia e sua influência social e ideológica, abre questões como “quem medeia a mídia?” e “Com quais consequências?”, para, enfim, chegar na via que busca explicação para o estudo da mídia.

Mais que investigar respostas para o conteúdo simbólico gerado pela mídia, é preciso entender a presença cotidana da mídia na sociedade. Uma sociedade intrinsecamente ligada com os instrumentos midiáticos, de uma conexão para outra. Do rádio para a internet, da internet para a televisão, da televisão para o telefone, do telefone para o jornal. Um ciclo cumprido individualmente ou em grupo.

E a mídia opera neste espaço, através destas conexões, no “mundo mundano” como citado por Silverstone. A mídia observa a realidade da vida cotidiana, a filtra, estabelecendo critérios, referências, representações e significações. Ou seja, a mídia baseia-se no cotidiano, no senso comum. Acrescenta que “a mídia nos deu palavras para dizer, as ideias para exprimir, não como força desencarnada operando contra nós, enquanto nos ocupamos com nossos afazeres diários, mas como parte de uma realidade que participamos” (p. 21). Silvestone acrescenta que a mídia depende do senso comum. “Ela o reproduz, recorre a ele, mas também o explora e distorce” (p.21).
Esta capacidade de distorcer é o que conduziu à reflexão de CHARAUDEAU sobre a mídia como um “espelho deformante, ou mais ainda, são vários espelhos deformantes ao mesmo tempo, daqueles que se encontram em parques de diversões e que mesmo deformando, mostram, cada um à sua maneira, um fragmento amplificado, estereotipado do mundo”. Ou seja, as mídias são o espetáculo da democracia e não a própria democracia.

Silverstone faz um paralelo entre a reflexão feita acerca da mídia em suas narrativas como integrante da vida social (novela, programa de rádio, telejornais), mas a experiências do mundo contemporâneo e ao papel midiático nela. Por exemplo, ele cita metáforas espaciais (comentando desde o conceito de pós-modernidade, em que o tempo não é mais o que era), e veículos antes baseados no tempo (como o rádio), e a internet e o videogame alterando este modelo temporal. É o espaço em múltiplas dimensões, como apontado por Manuel Castells (1996).

Fica evidente para o autor que estudar a mídia é compreender a sua contribuição para a textura geral da experiência, o que leva a indagação acerca da realidade da experiência. Há realidade? existe realidade na mídia ou no cotidiano? Tais observações vão de encontro com a teoria pós-modernista de que o mundo “é sedutora e exclusivamente” de imagens e simulacros. Ou seja:

“O mundo é um mundo em que as realidades empíricas são progressivamente negadas, tanto por nós quanto para nós, no senso comum e na teoria. Nessa visão, vivemos nossas vidas em espaços simbólicos e auto-referenciais que nos oferecem nada mais que generalidades do sucedâneo e do hiperreal” (p.26)

A abordagem levou-me ao conceito de abstração de BAUDRILLARD, em “Simulacros e Simulação”, que ao destacar o hiperreal, aponta para a “geração pelos modelos de um real sem origem nem realidade” (p.8)

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